Não digas adeus, ó sombra amiga,
Abranda mais o ritmo dos teus passos;
Sente o perfume da paixão antiga,
Dos nossos bons e cândidos abraços!
Sou a dona dos místicos cansaços,
A fantástica e estranha rapariga
Que um dia ficou presa nos teus braços…
Não vás ainda embora, ó sombra amiga!
Teu amor fez de mim um lago triste:
Quantas ondas a rir que não lhe ouviste,
Quanta canção de ondinas lá no fundo!
Espera… espera… ó minha sombra amada…
Vê que p’ra além de mim já não há nada
E nunca mais me encontras neste mundo!…
Florbela Espanca (in Antologia de Poetas Alentejanos)
"A vida é um piano.Teclas brancas representam a felicidade e as pretas a angústia.Com o passar do tempo você percebe que as teclas pretas também fazem música." A Última Música
quarta-feira, 9 de junho de 2010
Princesa Desalento
Minhalma é a Princesa Desalento,
Como um Poeta lhe chamou, um dia.
É magoada, e pálida, e sombria,
Como soluços trágicos do vento!
É frágil como o sonho dum momento;
Soturna como preces de agonia,
Vive do riso duma boca fria:
Minhalma é a Princesa Desalento...
Altas horas da noite ela vagueia...
E ao luar suavíssimo, que anseia,
Põe-se a falar de tanta coisa morta!
O luar ouve minhalma, ajoelhado,
E vai traçar, fantástico e gelado,
A sombra duma cruz à tua porta...
Florbela Espanca
A vida
É vão o amor,o ódio,ou o desdém;
Inútil o desejo e o sentimento...
Lançar um grande amor aos pés de alguém
O mesmo é que lançar flores ao vento!
Todos somos no mundo,
Uma alegria é feita dum tormento,
Um riso é sempre o eco dum lamento,
Sabe-se lá um beijo de onde vem!
A mais nobre ilusão morre...desfaz-se...
Uma saudade morta em nós renasce
Que no mesmo momento é já perdida...
Amar-te a vida inteira eu não podia.
A gente esquece sempre o bem de um dia.
Que queres,meu Amor,se é isto a vida!
Florbela Espanca
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